Além das câmeras

Família e amigos contam curiosidades da convivência com padre Léo

Conheça quem foi o Padre Léo irmão, amigo, conselheiro, colega de seminário e fundador da Comunidade Bethânia

Julia Beck,
com colaboração de Denise Claro e Elaine Santos

Padre Léo/ Foto: Arquivo – Canção Nova

Bom filho, engraçado, inteligente, teimoso, sincero e amoroso. Esse era o irmão, amigo, conselheiro, colega de seminário e fundador da Comunidade Bethânia, Padre Léo. São muitos papéis exercidos pelo sacerdote durante sua vida. Sua humanidade, pouco conhecida em profundidade por quem o acompanhava apenas através da televisão, é tida como marcante por muitos que conviveram com o futuro candidato a beato durante a infância, adolescência, juventude, vida adulta e enfermidade.

O irmão

Célia Pereira, irmã de Padre Léo/ Foto: Wesley Almeida – Canção Nova

“Você é irmã do santo?”. Essa é uma pergunta que Célia Pereira, irmã de Padre Léo, costuma ouvir. Quando a escutou pela primeira vez, Célia comenta que ficou surpresa, já que não imaginava que alguém de sua família poderia chegar a passar por esse processo. “Não esperávamos por isso, mas é uma grande honra”.

Elizabete Pereira, também irmã de Padre Léo, conta que, quando criança, o irmão gostava de “brincar de missa”. “Ele [Padre Léo] era brincalhão, mas na hora que brincava de Missa, de dar a comunhão, pra ele era coisa séria. Acho que era só nessa hora que ele era mais compenetrado”. Apelidada de Ziza, Elisabete revela que Léo era seu irmão mais próximo de idade. “Estávamos sempre juntos fazendo nossas bagunças. Sempre apanhávamos juntos também”.

Na escola, Ziza conta que o candidato a beato terminava rápido as tarefas e ficava conversando. “Ele era inteligente demais. A maior parte das coisas ele aprendeu sozinho”. A irmã mais velha, Célia, descreve o irmão como um aluno esperto e um bom filho. Sua autenticidade era perceptível desde a infância.

 

 

O irmão de padre Léo, Ernane Pereira, recorda de Tarcísio com saudade. “O Léo pra gente foi um grande irmão e muito mais, um grande filho, companheiro e sempre muito alegre”, observou. Ziza completa: “Léo era amado por todos, extrovertido, era o jeito dele”.

Sobre um dos momentos mais delicados da vida do novo Servo de Deus, o uso de drogas – que aconteceu antes que entrasse para o seminário do Sagrado Coração de Jesus, Célia destaca que o irmão manteve-se estudioso, brincalhão, prestativo e amoroso com a família. “Foi difícil perceber que ele precisava de ajuda”.

Os talentos que Padre Léo tinha para a música e como pregador tornaram-se perceptíveis no grupo de jovens. Célia conta que foi neste período que o jovem Tarcísio aprendeu a tocar violão e começou a cativar a juventude com suas pregações. “Ele chegava a reunir 100 jovens em uma tarde de domingo. Esses jovens se sentavam e ficavam por horas o ouvindo falar”.

“Lembro da alegria dele quando meus filhos nasceram”
Célia Pereira

A decisão de entrar para o seminário é recordada por Ziza. No começo, a irmã mais nova revela que desencorajou o irmão na tomada desta decisão: “Eu cheguei a dizer a ele: vai usar sua inteligência pra ser padre?”. Mas, ao ver o empenho de Tarcísio na evangelização, percebeu que essa era sua vocação. “Ele cuidava de vários grupos de jovens, não sei como dava conta de tudo! Ele usou a inteligência dele para isso mesmo, para ser padre”.

Ziza e Ernane, irmãos de padre Léo/ Foto: Wesley Almeida – Canção Nova

“Lembro da alegria dele quando meus filhos nasceram”, relembra Célia. A irmã mais velha, que sempre teve uma forte ligação com o sacerdote, conta que Padre Léo nunca deixava de ligar para parabenizá-la, quando fazia aniversário, e costumava ligar toda a segunda-feira. Um dos momentos mais marcantes para a irmã foi quando o paramentou em sua ordenação sacerdotal.

O colega de seminário e sacerdócio

Padre João Carlos Almeida, conhecido como padre Joãozinho, conheceu o padre Léo aos 19 anos de idade. Sacerdotes da congregação do Sagrado Coração de Jesus, eram o oposto um do outro. “Ele era mais velho, já havia namorado, trabalhado. Enquanto eu havia entrado no seminário aos 10 anos de idade”, frisa. Padre Léo conhecia a bíblia muito bem, mas foi na Faculdade de Teologia que passou a ser um exímio estudioso das Sagradas Escrituras, afirma o colega de seminário.

“Padre Léo tinha esquemas de pregação. As histórias, as piadas, eram todas escritas. O Léo não falava o que dava na cabeça. Ele estudava muito antes de fazer uma pregação e preparava tudo por escrito”, argumentou. Em sua primeira missa, após a ordenação sacerdotal, padre Joãozinho recorda que convidou o companheiro de seminário para proferir a homilia. “Lembro muito bem da pregação dele naquela missa”.

“Ele disse que todo homem que quer mudar a sociedade procura uma revolução, mas que a grande crise do mundo é a crise do amor, portanto, um padre do coração de Jesus é também alguém que quer mudar o mundo pela revolução do amor. Na Igreja estava um primo meu que fazia faculdade na época e dizia que queria mudar o mundo. Quando o Léo falou aquilo, meu primo saiu daquela homilia e foi procurar um seminário. Hoje ele é padre. Trabalha no México como missionário e a vocação dele foi despertada naquela missa com o padre Léo”.

Padre Léo fez parte de muitas situações importantes na vida de Padre Joãozinho. Após anos de convivência, o sacerdote reforça o sentimento de pertença ao carisma dehoniano que sempre foi próprio de Padre Léo, além de destacar que foi padre Léo quem abriu as portas para várias coisas que aconteceram em sua vida. O anseio e disposição pela evangelização são, para padre Joãozinho, registros de um Servo de Deus que viveu intensamente. 

 

Sobre a possibilidade do colega de seminário chegar a ser considerado um beato da Igreja Católica, o padre observa: “Santo não é quem não peca, mas é o pecador que se converte”. O calvário da doença enfrentada por Padre Léo, em 2006, foi para padre Joãozinho uma purgação para que o Servo de Deus se tornasse uma pessoa feliz na dor.

“A palavra beato quer dizer feliz e a maior felicidade dele foi a dor que viveu nesse um ano de graça em que foi se purificando à medida que vivia a doença. (…) Nós olhamos para essa doença e pensamos: que doença maldita que faz com que as pessoas percam um pouco de vida todos os dias. Mas, na verdade, ela faz ganhar um pedaço do céu”, concluiu.

O fundador da Comunidade Bethânia

O moderador-geral da Comunidade Bethânia, padre Vicente de Paula Neto, frisa que padre Léo não foi apenas o fundador da comunidade a que pertence, mas um amigo e conselheiro que o auxiliou em muitos momentos. Segundo o sacerdote, foram muitos os ensinamentos deixados pelo Servo de Deus, mas o principal, foi: “Deus é amor”.

Moderador-geral da Comunidade Bethânia, padre Vicente de Paula/ Foto: Wesley Almeida – Canção Nova

“Eu experimentei com ele [Padre Léo] isso, mas ele também me ensinou que Deus é humor. Que é possível evangelizar com alegria. Que você pode falar as verdades mais duras e necessárias com alegria e doçura”, pontuou. Ao se referir à Comunidade Bethânia, padre Vicente afirma que Padre Léo ensinou aos membros sobre a Misericórdia. “Ele tinha um amor acolhedor. O amor incondicional que acolhe sempre, em primeiro lugar. Que não faz perguntas sobre o passado de ninguém, porque acolhe e ama, depois aponta o caminho”.

“Padre Léo era capaz de sentar com uma filha, no início de Bethânia, e limpar a cabeça dela tirando piolho. Padre Léo era capaz de dar banho num filho bêbado. Padre Léo saía de madrugada para ir ao encontro dos drogados nas ruas da cidade de Brusque, preocupado, porque ele tinha uma cama para dormir, enquanto eles não tinham”.

Léia Scheidt foi secretária do Padre Léo na Comunidade Bethânia/ Foto: Wesley Almeida – Canção Nova

A antiga secretária de Padre Léo, Léia Scheidt, lembra que sua maior experiência de confissão foi com o Servo de Deus. “Escrevi meus pecados, e ele lia, e quando chegava nas ‘partes pesadas’ ele rezava por mim, e me abraçava. E ao final me disse: A Léia que você era antes de Bethânia não existe mais. O que importa pra Deus agora é quem você quer ser daqui pra frente. Deus usou do Padre Léo para me devolver a vida”, conta a secretária, que na adolescência cometeu uma tentativa de suicídio.

Ao recordar a personalidade de Padre Léo, Léia afirma: “A gente brigava muito, ele me chamava muito a atenção, mas ele me corrigia não para me julgar, me condenar. Ele me mostrou o caminho certo. Jamais ele abandonou um filho, jamais ele parou diante do nosso pecado, ele não desistia da gente. Enxergava qualidade onde a gente não enxergava nada. E graças a ele acreditando em mim, mostrando por onde seguir, eu encontrei o verdadeiro sentido da vida”. A secretária também comentou outros ensinamentos surgidos a partir da convivência com o Servo de Deus:

 

 

Amigo e companheiro na evangelização

Diácono Nelsinho Corrêa/ Foto: Canção Nova

“O Padre Léo não nasceu santo, ele tinha um temperamento muito forte, destemperado na boca, mas posso dizer sem medo que o que mais admiro nele era a sua santidade crescente. Ele foi tornando-se santo também aqui na Canção Nova. Cada aprofundamento e acampamento que ele vinha ele se santificava mais”. É o que sublinha o missionário da Comunidade Canção Nova, diácono Nelsinho Côrrea.

O missionário conta que conheceu o candidato a beato muito antes deste entrar para a seminário. Com parte da família natural de Itajubá (MG), cidade em que padre Léo passou sua infância e adolescência, diácono Nelsinho recorda os grupos de jovens e  trabalhos prestados para a Igreja. “Ele distribuía os folhetos das missas dominicais com o meu tio”.

O diácono conta que chegou a realizar uma viagem missionária para o Japão com o Servo de Deus. “Ele era inteligentíssimo, muito bem preparado”. Quando chegaram no país asiático, o diácono conta que o sacerdote havia pesquisado tudo sobre o Japão. “Sabia de tudo de cabeça e aí fazia suas piadas. Os japoneses morriam de rir”.

Ao saber da morte do amigo, o diácono afirma que participou do velório, mas que preferiu não vê-lo no caixão. “Não queria guardar aquela última imagem dele. Quero sempre lembrar dele sorridente, como sempre foi comigo. Padre Léo era um amigo e um irmão e a Canção Nova nos uniu mais ainda”.